Entrevista com o Gerente Global de Negócios para Indústria e Hidrogênio na ABB, Jorge Batarce.
Com uma matriz energética predominantemente renovável e infraestrutura estratégica robusta, o Brasil está bem posicionado para liderar o emergente mercado de hidrogênio verde. Essa é a visão do Gerente Global de Negócios para Indústria e Hidrogênio na ABB, Jorge Batarce, nosso entrevistado desta segunda-feira (19). O executivo conversou com o Petronotícias durante sua viagem ao Brasil para participar do evento FIEC Summit 2024, em Fortaleza (CE). Ele destacou o potencial que o Brasil e o estado do Ceará possuem no mercado de hidrogênio verde. “Ao olhar para o cenário global e classificar os lugares que oferecem mais chances para o sucesso de projetos de hidrogênio verde, os investidores que escolherem o Brasil provavelmente estarão alguns passos à frente dos demais”, analisou Batarce. O entrevistado explicou ainda que a ABB se dedica a apresentar aos clientes as melhores práticas e a fornecer suporte técnico para garantir que os projetos não apenas sejam viáveis, mas também altamente competitivos. Com a crescente demanda por soluções eficientes e a busca por alternativas sustentáveis, o executivo avalia que a ABB está posicionada para desempenhar um papel crucial na expansão da produção de hidrogênio verde no Brasil, contribuindo significativamente para a descarbonização de diversos setores industriais no país. “Eu diria que o Brasil é provavelmente um dos melhores lugares do mundo para assumir um papel de liderança global em projetos de hidrogênio, porque tem todas as características que outros países ainda estão buscando.”, ponderou.
Gostaria de começar nossa entrevista perguntando como a ABB está trabalhando para impulsionar a produção de hidrogênio no Ceará e quais são os principais desafios nesse caminho?
Como é de conhecimento do mercado, o hidrogênio está em alta atualmente. A ABB está trabalhando para explicar aos clientes como podemos realmente aprimorar suas capacidades, recursos e experiências, assim como as iniciativas deles desde os estágios iniciais. Como essa indústria é bastante nova, muitos pontos ainda não são padronizados, nem bem conhecidos. Por isso, estamos dedicando o tempo necessário para apoiá-los desde os primeiros estágios, passo a passo, para primeiro entender o que faz sentido, quais casos de negócio são os mais robustos, quais são os projetos mais bem desenhados e, finalmente, escolher a tecnologia mais apropriada. Assim, estamos conectando todas as diferentes dimensões de como um projeto deve ser estruturado.
Dessa forma, estamos ajudando não apenas os desenvolvedores, mas também qualquer tipo de investidor e as autoridades locais com as informações necessárias sobre os desafios, a fim de aumentar a competitividade desses projetos na região. Portanto, cobrimos toda a cadeia de valor com as informações que somos capazes de desenvolver, engajando com clientes globalmente.
E quais tendências globais o senhor enxerga no mercado de hidrogênio, especialmente em relação à viabilidade financeira dos projetos?
Essa é uma pergunta muito boa. Toda essa indústria começou já há alguns anos, e muitas pessoas pensaram que o hidrogênio resolveria todos os problemas. Mas a verdade é que nem tudo pode ser, eventualmente, resolvido pelo hidrogênio, pois ele é apenas um sistema energético, e os sistemas energéticos precisam ser eficientes para serem viáveis. Por isso, a ABB classificou internamente todas as possíveis aplicações do hidrogênio sob dois eixos: qual é a tecnologia e quão eficiente é o processo?
As tendências globais estão muito relacionadas à integração das fontes renováveis em diferentes tipos de processos. O hidrogênio é apenas mais um processo sendo eletrificado e enfrenta os mesmos problemas que grandes centros de dados e grandes projetos de mineração, por exemplo. A única coisa que temos em comum nesses casos é que começamos com algo que é variável, que é a natureza das fontes de energia renováveis, e precisamos operar de uma maneira muito previsível. Portanto, uma tendência global é dedicar esforços para resolver isso, que é, em grande parte, um problema elétrico.
Poderia comentar um pouco sobre o que a empresa está fazendo para tornar os projetos de hidrogênio mais competitivos, especialmente no Brasil?
O Brasil tem condições muito favoráveis, e o estado do Ceará provavelmente possui as melhores condições do país, principalmente porque há projetos de infraestrutura em andamento que permitirão ao estado ser bastante competitivo.
À medida que os desenvolvedores buscam preços baixos de ativos renováveis, eles também precisam levar em conta a estabilidade do fornecimento de energia. No Brasil, a maior parte da energia é renovável e estável, devido às grandes instalações hidrelétricas. Além disso, há uma infraestrutura de transmissão conectada, e uma boa parte da energia está sendo produzida na região Nordeste. Portanto, o Brasil está muito bem posicionado.
O que estamos fazendo aqui é assessorar os clientes em como projetar os projetos, do início ao fim, com base em princípios de design, para que possam reorganizar ou definir corretamente as prioridades e, assim, abordar o projeto passo a passo. Um dos erros que vemos com frequência é que os clientes avançam muito rápido na seleção de tecnologia.
Então, o que estamos tentando fazer agora é explicar aos clientes de uma maneira que não seja influenciada por tecnologias específicas. Neste caso, estamos falando sobre elaborar um estudo de viabilidade, escolher o design do processo e, depois, abordar os critérios de seleção da tecnologia. Dessa forma, passo a passo, alinhando essas três dimensões, podemos tornar um projeto não apenas viável, mas também competitivo.
Como você vê o Brasil e o Ceará desempenhando um papel de liderança em projetos globais de hidrogênio?
Quando você olha para o cenário global, descobre que existem regiões no mundo onde é possível produzir energia de maneira eficiente em termos de custos, como na Europa, por exemplo. E há lugares onde há energia verde em abundância e capacidade de produzir energia de forma muito competitiva, que pode ser exportada e utilizada em outros lugares.
É importante notar que o Brasil está muito próximo da Europa, com uma robusta infraestrutura conectada, especialmente os portos. Adicionalmente, como já mencionei anteriormente, a matriz de geração do Brasil é majoritariamente composta por fontes renováveis, e em grande parte por hidrelétricas. Além disso, o país conta com uma grande infraestrutura de transmissão para transportar essa energia.
O Brasil possui duas peças essenciais nessa equação. A primeira é a capacidade de viabilizar um projeto de hidrogênio com uma infraestrutura conectada, que muitos outros lugares no mundo não possuem. A segunda é a produção de grande quantidade de energia de forma estável e confiável. Então, eu diria que o Brasil é provavelmente um dos melhores lugares do mundo para assumir um papel de liderança global em projetos de hidrogênio, porque tem todas as características que outros países ainda estão buscando.
Portanto, ao olhar para o cenário global e classificar os lugares que oferecem mais chances para o sucesso de projetos de hidrogênio, os investidores que escolherem o Brasil provavelmente estarão alguns passos à frente dos demais.
Então, na sua opinião, o Brasil será muito importante para o negócio de hidrogênio da ABB nos próximos anos?
Absolutamente. Em qualquer dimensão possível, esse mercado é extremamente atraente para nós. Temos muitos clientes que estão começando a estruturar projetos, tanto em áreas não desenvolvidas (greenfields) quanto em áreas já estabelecidas (brownfields) em toda a cadeia de valor. Porque o hidrogênio não é apenas sobre produzir derivados, como a amônia verde, mas também sobre descarbonizar outros ativos.
O Brasil dispõe de vários ativos industriais que estão caminhando rumo à descarbonização, em setores como papel e celulose, cimento e siderurgia. Qualquer ativo industrial que atualmente utiliza carvão ou gás pode migrar para o uso de hidrogênio. Nesse contexto, a ABB pode apoiar seus clientes no estudo de viabilidade, na fase de design ou na etapa de seleção de tecnologia.
Fonte: PETRONOTÍCIAS.